Arte: Francisco Carlos da Silva A Baixada dos meninos... Ajudando a forjar homens e uma excepcional história... |
Aquele menino nasceu numa época de promissoras mudanças e
transformações sociais. Na largada de um século no qual a humanidade
revolucionou o seu modo de viver, trazendo inúmeros avanços e conquistas nunca
antes imaginadas. Concomitante a marcha do progresso as tragédias das cobiças,
os holocaustos (assim mesmo, no plural), as chagas da ignorância e suas dores.
A civilização alternando barbárie, a barbárie disfarçada de civilização e assim
seguimos...Sem aprender. Repletos de
feridas que insistem em permanecer abertas.
Mas, o assunto é o menino. O mesmo acaba de cruzar faceiro e
moleque por estas linhas. Desceu do bonde e já disparou em desabalada carreira
na direção da Rua XV de Novembro. Após, seguirá vigoroso pela Voluntários da Pátria. Nem acena, tomado por
febril ansiedade. Pois, ainda hoje (e sempre) neste dia que começou e nunca
termina (tendo o azul do céu trajado um celeste nunca visto), seguirá
praticando o desafiador esporte que certo dia -no promissor ano de 1903 - foi
apresentado à pacata sociedade porto-alegrense por aqueles ingleses, alemães e
lusos oriundo do Sul da Província.
Angariando simpatias e adeptos lá está o menino nos campos da
Várzea da Redenção. Perseguindo o balão de couro com contagiante entusiasmo,
sorrindo. Nem percebe o movimento dos ponteiros do relógio. E corre, e luta, e
vence, e se supera. Ao dar-se conta respira a Baixada, no instante seguinte transpõem o pórtico
do Olímpico. Faz história. Extenuado, satisfeito, mira o quanto já percorreu, o
tanto que somou, os sentimentos que despertou geração após geração, ganhando
multidões, fazendo-se admirado e idolatrado por uma numerosa e vibrante Nação.
O menino, o leitor também o vê, está logo ali. Circula pelo Humaitá, pela Vila
Farrapos. Traja as mesmas calças compridas, os suspensórios, o boné e,
principalmente, calça as mesmas embarradas, pesadas e surradas botinas. Fortes
e vigorosas botinas dos que com bravura construíram um passado, um presente e
projetam um futuro cada vez mais azul, preto e branco. Aquele menino
aniversariou. Tem, agora, 112 anos e segue jovial e destemido, desafiando o
tempo, as adversidades, a incredulidade. Aquele menino é orgulho meridional e
mundial. É o que faz o Rio Grande cantar com amor as façanhas que devem servir
de modelo a toda Terra. Aquele menino vive e viverá. Aquele menino é Imortal.
@JorgeBettiol